- Já olhaste para o sol?
- Já. E senti o calor e admirei a luz. E a metade de mim olhou por tempo demais, e nada mais viu.
- Já paraste à noite, em um lugar escuro para olhar o céu?
- Já. E as estrelas me maravilharam com seu brilho e sua beleza. E a lua despertou em mim a ternura. E a metade de mim lembrou que, apesar de tanto brilharem, elas já não estão mais lá e que a lua é rocha sem vida.
- Da água límpida já provaste?
- Já. E enquanto ela descia por minha garganta e escorria pelos meus dedos ela me refrescou. E a metade de mim quis ir mais fundo e a água não era mais refrescante, mas sufocante.
- E já fechaste os olhos e viste a escuridão?
- Já. E sem nada ver senti a grandeza de minha própria vastidão. E a metade de mim mostrou os fantasmas que habitam a escuridão e tive medo.
- Amaste alguma vez?
- Já. E a felicidade da entrega foi tanta que de mim esqueci. E a metade de mim já sofreu e chorou quando o amor acabou.
- E sobre a morte, já pensaste?
- Já. E isso não me preocupou, pois todas as coisas tem um fim. E a metade de mim lamentou tudo o que ficaria sem fim após seu fim.
-E o nascer e o cair do dia, presenciaste?
- Já. E como são mágicos aqueles instantes em que noite e dia não mais se diferenciam. E a metade de mim constatou que nada se pode fazer contra o constante fluir do tempo.
-E o silêncio, escutaste?
- Já. E instantes de tranquilidade e paz foi o que o som me trouxe. E a metade de mim só pode sentir a solidão.
-E sonhar?
-Sonhar. Já. E os sonhos alimentaram as esperanças futuras. E a metade de mim disse que sonhos são para tolos, não mais que ilusões.
- E alguma vez já olhaste para si?
- Já. E então vi que eu sou eu e a metade de mim.
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